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O conto Amor de Clarice Lispector

  • Foto do escritor: Joana Buschini
    Joana Buschini
  • 15 de dez. de 2024
  • 2 min de leitura


Ana subiu no bonde, no que parecia ser mais um dia em que ela, obstinadamente, cultivava a ordem das coisas. “Ana sempre tivera a necessidade de sentir a raiz firme das coisas”. 

No bonde, avistou um cego, e essa visão a inquietou: o cego mascava chicletes. O bonde arranca bruscamente, fazendo-a cair para trás. Os ovos que ela carregava no jornal haviam se quebrado, e agora pingavam entre os fios da rede que o seguravam. 

O mal estava feito. “A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido”. A crise a jogara num desfiladeiro de sentido, onde tudo passara a ser experimentado com um prazer intenso que a fazia sofrer espantada. As coisas ganhavam vida e a falta de sentido tornava-as tão livres que mal sabiam para onde ir. 

“Ao seu redor havia ruídos serenos, cheiro de árvores, pequenas surpresas entre os cipós. Todo o jardim triturado pelos instantes já mais apressados da tarde. De onde vinha o meio sonho pelo qual estava rodeada? Como por um zunido de abelhas e aves. Tudo era estranho, suave demais, grande demais”.

Há uma verdade que se anuncia para Ana, sobre ela própria, quando encontra o cego. Ele desmonta as defesas que a estabilizaram, de forma frágil, no seu “destino de mulher”. Frágil, pois algo já se anunciava na “hora perigosa da tarde, quando a casa estava vazia sem precisar mais dela” ou no fogão enguiçado que dava estouros. 

Algo irrompe, algo não pode mais ser contido. A vida e seu perigo. 

A pulsão se anuncia em ato. 


Fazemos análise para encontrar o ponto ~cego~ das coisas. O que desestabiliza a ordem das coisas que mantém fixado nosso destino no sofrimento.


 
 
 

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